“O uso da data de ocorrência (e não da data de registro) auxiliará a se ter um panorama mais realista do que ocorre em nível nacional e favorecerá a predição, criando condições para a adoção de medidas mais adequadas para o enfrentamento da Covid-19, nos âmbitos regional e nacional”, justifica em comunicado.

O problema se intensifica porque o online não vem apresentando, desde a semana ada, acumulado de mortes e casos no Brasil (o que ocorria anteriormente). Com isso, para ter o quadro geral, o interessado entrar nos dados de cada dia, todos os dias, para constatar as alterações.

A omissão sobre esses dados consolidados dificulta o acompanhamento de entes que não estão diretamente ligados aos órgãos de saúde, como tribunais de conta, Ministério Público e imprensa. Tal decisão rendeu críticas até mesmo de membros que estiveram no governo. Em entrevista à CNN no início desta tarde, o ex-ministro Nelson Teich indicou a necessidade de o ministério rever a alteração. “Não consigo imaginar a ideia de ocultar a informação. Se o ministério não consolidar [os dados do acumulado de mortes e registros diários], as secretarias vão consolidar (...). A gente começa a ter uma série de números conflitantes”, disse.

Para analistas e entidades, além da crise de credibilidade sobre os dados do governo, abre-se um panorama perigoso em que as pessoas imaginam uma desaceleração da pandemia que não existe.

E o conflito, de fato, vem ocorrendo. De acordo com um online do Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde (Conass) , foram 1.116 mortes no balanço do domingo. O dado do MS é de 525. O site informativo faz parte de série de iniciativas de contagem alternativas no bojo da desconfiança dos números oficiais.

O Conass atualizará os números diariamente, mostrando consolidado de mortes e registros diários, além dos novos e acumulado dos casos. Ao portal Uol, o presidente da entidade, Alberto Beltrame, classificou hoje como "confusão desnecessária" as mudanças na metodologia do ministério.

“É bastante simples. O registro nas 24 horas é o número de óbitos divulgado em determinado dia. Não significa que tenham ocorrido nas últimas 24 horas, podem ter ocorrido há cinco dias, por exemplo. Foram investigados, confirmados e registrados hoje. Numa curva logarítmica, onde os óbitos são colocados, o próprio sistema ajusta e lança o dado no dia de sua efetiva ocorrência. Isso permite uma análise de tendência. Quando é lançado numa curva cumulativa, somente soma o óbito, e esta curva subirá sempre, pois os óbitos vão se acumulando e apontarão para o infinito", disse o dirigente.

Uma coalizão de veículos de comunicação (Globo, Extra, O Estado de S.Paulo, Folha de S.Paulo, G1 e UOL) também ará a ter levantamento feito diretamente com as secretarias estaduais de saúde. O trabalho já vinha sendo feito pelo G1.  “Cada órgão de imprensa divulgará o resultado desse acompanhamento em seus respectivos canais. O grupo vai chamar a atenção do público se não houver transparência e regularidade na divulgação dos dados pelos Estados”, escreveu o jornal O Globo.

Respostas internacionais

Embora cada país tenha apresentado um padrão de monitoramento durante a pandemia, a Organização Mundial de Saúde (OMS) sugere apresentar um conjunto de informações completas – nos moldes do que vinha sendo feito no país.

A Espanha foi umas das exceções e adotou uma metodologia semelhante àquela proposta pelo nosso Ministério da Saúde. Neste mês, ou a divulgar apenas as ocorrências nas 24 horas mais recentes. A medida foi bastante criticada pela oposição – o país é governado por um governo de esquerda. O deputado conservador Pablo Casado, líder do Partido Popular, classificou a mudança como uma “falta de respeito" com os espanhóis.

Maria Jesús Montero, porta-voz do governo, itiu que a metodologia pode distorcer as estatísticas. Diferentemente do Brasil, porém, o país está em queda de registros da doença.

Para a OMS, o Brasil deveria voltar atrás na decisão. "Nosso entendimento é que o governo do Brasil continuará a reportar os importantes números diários, de uma maneira desagregada", disse ele durante entrevista coletiva, acrescentando que a OMS tem tido o a "dados extremamente detalhados" da Organização Pan-Americana (Opas) e do próprio país. "Esperamos realmente que isso continue."

Risco aos bancos de dados de saúde

Para representantes da comunidade médica, a alteração abre precedentes perigosos. De acordo com o infectologista Fabio Gaudenzi, membro deliberativo da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), a alteração não afeta as ações contra a Covid em um momento inicial. “Os municípios e estados, que são os principais gestores das ações de controle do coronavírus, possuem a gestão integral destes dados”, diz. “Em teoria, os estados e municípios ainda têm condições de ar esses dados, fazer suas análises e suas políticas”, indica.

O especialista teme, no entanto, que o estreitamento na divulgação das informações possa se estender a bancos de controle essenciais aos municípios e estados: os sistemas de informações e-Sus-VE e Sivep-Gripe – que são ferramentas controladas pelo governo federal que registram casos leves e graves de doenças respiratórias.“Todos esses sistemas tem a gestão com o Ministério da Saúde. Se começa a ter uma instabilidade, a base de dados fica inível para os municípios e estados”, diz. “Se em algum momento o ministério tiver problema na gestão destes sistemas, esses entes não terão como realizar as ações (de combate e prevenção)”.

Alterações sistemáticas nas informações sobre a Covid-19

Ainda em abril, durante a gestão do ex-ministro Luiz Henrique Mandetta, os dados sobre a Covid-19 eram divulgados às 17 horas. Semanas depois de sua saída, o boletim ou a ser divulgado às 19 horas.

Na última semana, o MS abriu um novo capítulo nesta troca, ando a apresentar os números somente após as 21h30. Em entrevista na entrada do Palácio do Planalto, o presidente Jair Bolsonaro chegou a itir que a alteração evitava a divulgação do número de mortos diários no Jornal Nacional, da Rede Globo.

Também na última semana, o deixou de apresentar os números consolidados de mortes ao longo de toda a pandemia. Apenas as ocorrências diárias aram a compor o quadro. Foram eliminados do site os links para s de dados em formato de tabela, usados por pesquisadores e veículos de comunicação.

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