
também era um ambiente virtual interativo em formato 3D, focado nas interações sociais entre os usuários. Ou seja, também como o Metaverso, era um mundo de mentirinha, que, imagino, só pode parecer interessante para quem tem uma vida muito chata, é desocupado e tem tempo de sobra para gastar.
Criada pela Linden Lab, a plataforma, aliás, ainda existe, com poucos milhares de usuários teimosos – no pico, o Second Life chegou a ter 600.000 pessoas conectadas simultaneamente, a população de uma cidade brasileira de médio porte.
De qualquer forma, bastante avançada para a época (inclusive na interface gráfica), a plataforma trazia como principal novidade a criação de uma economia virtual, paralela, que podia ser convertida em dinheiro de verdade (ou em dívidas – como se não bastasse fracassar financeiramente na vida real, você também se endividava no mundo paralelo).
Além de lojas virtuais, onde os usuários comuns gastavam dinheiro real, grandes empresas – incluindo, no Brasil, a estatal Petrobras – chegaram a investir milhões no Second Life, comprando “terrenos” dentro do jogo, um exemplo de como os departamentos de marketing costumam ser responsáveis com dinheiro.
Anos depois, surgiram diversas explicações para o fracasso do Second Life. Vale a pena recapitular os motivos do colapso, até para analisar de que forma o Metaverso pode enfrentar os mesmos problemas.
Em um primeiro momento, pode parecer interessante ear por shopping centers virtuais e interagir com avatares de corpos perfeitos (sempre muito mais atraentes, seguramente, que as pessoas reais por trás deles). Participar de festas e reuniões virtuais também tem seu charme. Mas as pessoas normais tendem a se cansar rapidamente do repertório inevitavelmente limitado de experiências de uma plataforma virtual. Foi o que aconteceu com o Second Life – e pode perfeitamente acontecer com o Metaverso.
Por envolver o uso de dinheiro de verdade e por não contar com um sistema de moderação muito sofisticado, o Second Life era proibido para menores de idade. Outro problema que afastou o público muito jovem foi o fenômeno de erotização da plataforma por usuários em busca de pegação virtual, o que assustou muitos pais e pessoas não interessadas nesse tipo de interação.
Ora, nenhum projeto ambicioso desse porte pode se dar ao luxo de dispensar o público adolescente, o que cria um ime de difícil solução: se houver um excesso de controle, serão os adultos que se afastarão da plataforma. O episódio da denúncia de assédio sexual que comentei no artigo ado é um exemplo de como usuários emocionalmente carentes e amorosamente frustrados em busca de uma ilusão de sucesso podem invadir o Metaverso – e de lá serem sumariamente escorraçados.
Tem muita gente comparando o Metaverso às criptomoedas em termos de oportunidade de enriquecimento para os primeiros entrantes. De fato, há que tenha enriquecido com moedas virtuais, o que não impede que essa bolha exploda a qualquer momento.
A verdade é que, como no mundo real, no mundo virtual convém desconfiar de promessas de dinheiro fácil. No Second Life, muita gente que comprou “terrenos” (como a Petrobras) na expectativa de enriquecer rapidamente logo se deu conta de que jogou dinheiro fora, já que o preço dos “terrenos” não demorou a despencar – emulando, como farsa, a crise da bolha imobiliária no mundo real.
Como as moedas virtuais, os terrenos virtuais só valem alguma coisa enquanto tiver muita gente acreditando neles. Se muita gente deixar de acreditar, o valor desaparece.
A liberdade dos usuários do Second Life atraiu muita gente maluca, inclusive pessoas doentes interessadas em zoofilia. Eram proibidos jogos de azar, injúria e difamação, mas eram liberadas, por exemplo, “salas de sexo entre humanos e animais” (oi?), frequentadas, por exemplo, por “Lolitas-lobisomem” e Minotauros sarados. Também ficaram célebres episódios de gravidez e parto virtuais, o que é realmente algo muito esquisito.
Mas a pá-de-cal no Second Life foi, justamente, o crescimento meteórico do Facebook, do Twitter, do Instagram e outras redes sociais – que, mal ou bem, se referenciam na vida real, ainda que sejam plataformas virtuais. A socialização com pessoas reais, ainda que mediada virtualmente, é sempre muito mais interessante que a encenação da socialização com avatares, em um mundo de ficção.
Basta dizer que o Facebook já chegou a mais de 500 milhões de s diários, em sua fase mais popular, número a anos-luz de distância do Second Life em seu auge. Mas vale lembrar que a censura cada vez mais explícita, ainda que travestida de sistema de moderação, já está afastando muita gente da rede de Mark Zuckerberg. Daí, talvez, seu investimento no Metaverso.
Conclusão: da mesma forma que a “segunda vida” demonstrou ser tão chata e problemática quanto a primeira, o Metaverso pode rapidamente desiludir quem está animado com a oportunidade de viver na plataforma uma vida menos ordinária que a do mundo real.